Academia de Letras do Tringulo Mineiro

Fundadores - João Henrique Sampaio Vieira da Silva


João Henrique Sampaio Vieira da Silva - Cadeira 18

Patrono: Visconde Vieira da Silva

Posição: Fundador
Sucedido por: Felix Renato Palmério


Biografia

João Henrique Sampaio Vieira da Silva nasceu, segundo José Soares Bilharinho (História da Medicina em Uberaba, vol. III, onde lhe dedicou vinte e nove páginas), em Fortaleza/CE, em 1896, sendo descendente do visconde Vieira da Silva, do Maranhão, que foi ministro do Império.

Atividade Profissional
Formou-se em medicina pela faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1917, defendendo a tese Do Conceito Eugênico do Habitat Brasileiro, pela qual recebeu o prêmio “Cunning". Clinicou no Rio por alguns meses.
Daquela cidade veio diretamente para Uberaba, residindo no hotel do Comércio. Enquanto decidia se permaneceria na cidade, relatou seu biógrafo, foi instado a se transferir para Goiás, mediante vantajosa proposta. Contudo, com a incidência da "gripe espanhola" foi tão solicitado, que resolveu aqui se estabelecer.
Em outubro de 1918 passou dirigir a seção ''Consultório Medico", do Lavoura e Comércio, respondendo indagações dos leitores e atendendo os consultantes, quando necessário, diariamente em consultório montado na redação.
Por essa ocasião acusaram-no de mercantilização da medicina, tendo reptado seus caluniadores anônimos a apresentarem as provas das aleivosias. Ao contrário disso, seguiram-se inúmeras declarações de apoio.
Em 1920, organizou em seu consultório um posto de vacinação visando gratuitamente imunizar a população contra a varíola.
A partir de abril de 1923, de sociedade com seu sogro médico José Ferreira, instalou filial em Uberaba do instituto Laborda, da Argentina, detentor de método especializado de tratamento médico, e que, no Brasil, só as tinha até aquela data as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Santos, Porto Alegre e Juiz de Fora.
Mesmo quando eleito deputado estadual (1924) e posteriormente federal (meados da década de 30), não deixou, em suas vindas e permanências na cidade, o exercício profissional, continuando a clinicar.
Encerrado seu mandato federal, dedicou-se exclusivamente à medicina, tendo, nessa oportunidade, passado a utilizar ondas curtas no tratamento de inúmeras moléstias, no que foi pioneiro em Minas, conforme ressaltado, na ocasião, pelo jornal Lavoura e Comércio, de 24 de março de 1938, transcrito na História da Medicina em Uberaba (vol. III, p. 1.213).
Segundo ainda José Bilharinho (op.cit., vol. III, p. 1.213), ''seu pioneirismo estendeu-se também à endocrinologia", instalando em seu consultório " aparelho para determinação do metabolismo basal", sendo também, informou o citado historiador, o primeiro médico, ''em Uberaba, a organizar o fichário de pacientes" (idem, idem, p. 1.214).
Em atividades correlatas à prática profissional, ocupou na década de 1940 a presidência da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Uberaba e na década seguinte foi um dos fundadores da faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro. Anteriormente, em 1925, relatou José Tomás da Silva Sobrinho em discurso em que o homenageou pronunciado em 1965 por ocasião da inauguração da sede própria da subseção de Uberaba da Associação Brasileira de Odontologia (ABO), peIo fato de João Henrique - juntamente com os médicos José Ferreira, Jorge Frange, Mineiro de Lacerda e outros - ter promovido a instalação, em Uberaba nos fins da década de 1920, de escolas superiores de Farmácia e Odontologia, nelas lecionando bacteriologia. Face à sua riqueza de informações, essa saudação foi publicada em Lavoura e Comércio de 09 de maio de 1966 e transcrita na íntegra na História da Medicina de Uberaba (vol. Ill, p. 1.217/1.218).

Vereador e Agente Executivo
Intensa e desenvolvida desde 1920 até início dos anos 60 foi a atividade política e administrativa de João Henrique.
Já em 1920, recém-formado e aqui residindo há pouco tempo, foi eleito, juntamente com Alexandre Barbosa, vereador na legislatura iniciada em 01 de janeiro de 1919 e encerrada em 31 de dezembro de 1922, em pleito que se travou em novembro de 1920 para preenchimento de duas vagas deixadas por renunciantes, e de imediato João Henrique foi eleito também presidente da Câmara e, em decorrência, agente executivo (prefeito) de Uberaba, cargo em que sucedeu a Silvino Pacheco de Araújo e foi sucedido, a partir de 01 de janeiro de 1923, por Leopoldino de Oliveira.
A eleição de João Henrique à presidência da Câmara surpreendeu os democratas (do P.R.M. Democrata), conforme assinalou Hildebrando Pontes, pois, esperavam que Manuel Terra completasse o mandato em substituição ao presidente renunciante, Silvino Pacheco de Araújo.
Contudo, desde agosto, o partido da Concentração Municipal, ao qual Henrique pertencia, em reunião para deliberar sobre a questão, já decidira unanimemente que o indicado para o posto seria João Henrique, conforme notícia publicada no Lavoura e Comércio, de 22 de agosto daquele ano, não sendo, pois, justificável a referida surpresa. Aliás, por sua importância no contexto, a essa reunião Hildebrando também se referiu em sua obra histórica.
Entre suas principais medidas no cargo, lembrou José Tomás da Silva Sobrinho, destacaram-se a construção do prédio do Mercado Municipal, a elaboração da primeira Codificação do Ensino Municipal e a convocação do sanitarista Saturnino de Brito para projetar o serviço de água e esgoto de Uberaba e traçar "as diretrizes da urbanização da cidade com o projeto de abertura das avenidas que aí estão”. Ademais disso, em 1922, segundo Hildebrando (História de Uberaba, p. 393), "encarregou o engenheiro Álvaro Mendonça do levantamento da planta topográfica desta cidade” sobre a qual se baseou o projeto de Saturnino de Brito. Hildebrando informou, ainda, que, sob sua administração, foi procedido o calçamento a paralelepípedo de parte da rua Tristão de Castro, lado esquerdo da praça da Gameleira (Afonso Pena), praça Comendador Quintino, subida do ginásio Marista e de uma das ruas do alto do Mercês. Principalmente revelou que, em 1921, João Henrique restaurou a biblioteca municipal, desbaratada pela administração anterior de Silvino Pacheco.
Orlando Ferreira, em Terra Madrasta, além de opor restrições, no que foi useiro e vezeiro, à construção do Mercado (por sua arquitetura e localização) e à qualidade do calçamento das ruas, não se referiu a nenhuma das demais medidas implementadas pelo então agente executivo João Henrique à frente da administração municipal, em clara demonstração de unilateralismo, conquanto reconhecendo ser ''inteligente, mas muito jovem" (p. 34 e 35) e ressalvando sua posição em outras ocorrências administrativas (p. 89/90).
Ilustrativa a esse respeito, pelo fato e sua citação, a informação que Doca veiculou de que Melo Viana, então liderança política estadual, teria dito que "preciso prestigiar em Uberaba o dr. João Henrique para aniquilar o dr. Leopoldino de Oliveira" (p. 118), assertiva e prática que, por sua testemunham algumas das razões do atraso de Minas Gerais.
No decorrer de seu mandato, em maio de 1922, João Henrique foi atacado em sua honra pelo jornalista Moisés Santana em versos publicados no jornal A Separação, sob o título "Zangarreando”. A ofensa, considerada gravíssima naquela época, cujo “comportamento social vigente", segundo José Bilharinho (op.cit.,vol. III, p. 1.207), exigia enérgica reação, levou-o a procurar seu desafeto na redação do jornal Lavoura e Comércio, o qual, confirmando a autoria do artigo, foi por ele mortalmente alvejado, dirigindo-se em seguida João Henrique ao quartel da Policia Militar, a cujo comando se apresentou. Posteriormente, foi julgado, absolvido e colocado em liberdade, reassumindo seu mandato na Câmara e a função executiva que exercia.
Após ter sido deputado estadual, voltou a exercer a vereança na legislatura de 1927/1930, a última antes do movimento de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder.

Deputado Estadual e Federal
Em julho de 1924, recebeu convite de líderes políticos do Maranhão para se candidatar a governador daquele Estado. Preferiu, no entanto, continuar em Uberaba, candidatando-se a deputado estadual, onde, segundo José Tomás, bateu-se pelo prolongamento da Rede Mineira de Viação, antigo projeto de seu sogro, dr. José Ferreira, transformado em lei em 1904 e só concretizado em 1926, e ainda pela recriação da Escola Normal, anteriormente fechada, como foi (ou ainda é) vezo dos governos estaduais (ver Instituto Zootécnico, que teve suas atividades suspensas definitivamente por simples telegrama do governador Silviano Brandão, em agosto de 1898). Além disso, informou José Tomás, “foi autor do projeto de reforma do nosso Serviço de Higiene, do qual surgiram todos os centros de saúde de Minas Gerais e entre eles, o de Uberaba”.
Por três vezes candidatou-se a deputado federal, sendo eleito, a primeira vez, na década de 1930, e a segunda após a redemocratização do país, em 1946, não conseguindo, porém, reeleger-se em sua terceira candidatura, já nos anos 50.
No segundo mandato foi eleito e reeleito presidente da Comissão de Diplomacia e Tratados da Câmara, representando várias vezes o Brasil no exterior, seja como ministro plenipotenciário no México ou observador diplomático nos Estados Unidos. Na IX Conferência Interamericana, realizada em Bogotá/Colômbia, em 1948, na qual se criou a Organização dos Estados Americanos (OEA), por proposta do delegado dos Estados Unidos e unânime aprovação dos demais, ocupou a presidência da Comissão de Assuntos Culturais, oportunidade em que, discursando, apresentou a sua visão sobre a educação e fez estudo comparativo entre a legislação social brasileira e a Carta Interamericana de Garantias Sociais.
Por ocasião da visita ao Brasil do presidente dos Estados Unidos, Harry Truman — recebido em sessão conjunta do Congresso Nacional em 05 de setembro de 1947 - pronunciou João Henrique, como representante da Câmara Federal, discurso de saudação, no qual, de início, lembrou a célebre assertiva do padre Vieira em carta ao rei de Portugal, rogando-lhe "escusas de não haver tido tempo de ser breve", mas, que ele, orador, tivera tempo para sê-lo, “como convém à solenidade desta natureza" (Novos Rumos Para a Diplomacia Brasileira, p. I 75).
Além de outras iniciativas, lembrou José Tomás, que o dr.João Henrique foi ''autor do movimento do qual resultou a famosa e oportuna Lei da Moratória" e, ainda, "foi quem mais se esforçou pela construção do palácio dos Correios e Telégrafos” de Uberaba.
A falta de êxito de sua terceira candidatura a deputado federal foi atribuída por Dalísio Vicente de Paula (Gabi), um dos maiores conhecedores de fatos da política e de acontecimentos sociais da cidade, em grande parte à circunstância de não ter tido João Henrique condições de manter até a data da eleição o ritmo, a intensidade e o volume iniciais da campanha.

Outras Atividades
Nomeado membro do Conselho Superior das Caixas Econômicas Federais, então subdivididas em 22 autarquias, foi sucessivamente reeleito por vários mandatos, ocupando sua presidência até o advento do governo Jânio Quadros. Segundo José Bilharinho (op.cit., vol. III, p. 1.216), o cargo equivalia, à época, pela sua importância e representatividade, ao de ministro de Estado. Sua gestão foi "louvada por vários ministros da Fazenda e por dois presidentes da República”, conforme o diretor da Caixa, C. J. de Assis Ribeiro (idem, idem, p. 1.223). Entre suas realizações à frente do Conselho, destacaram-se as criações do Sasse (serviço de previdência dos economiários) e da caderneta de poupança, sobre a qual, aliás, escreveu um livro.
Em 1959 pleiteou, da mesma forma que a rede Tupi e o empresário e político Francisco Lopes Veludo, a concessão de canal de televisão para Uberaba, concorrência vencida, no entanto, por aquela organização.
A partir daí, passou a dedicar-se à direção de financeira em São Paulo, da qual era sócio, e de fazenda de sua propriedade, falecendo em agosto de 1974.
Foi um dos fundadores da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, ocupando a cadeira 18, da qual é patrono o visconde Vieira da Silva.

Produção Intelectual
Além de ter militado na imprensa, como articulista principalmente da Gazeta de Uberaba, João Henrique escreveu e publicou inúmeros livros e ensaios, entre os quais:
Pragmatismo Político (estudos apresentados na Assembleia Legislativa de Minas Gerais);
Ingenieros e o Brasil (refutando a afirmativa do sociólogo argentino, de que a nosso país faltariam clima e raça);
Organização Agrária Sem Comunismo (versando sobre uma das questões mais controvertidas e debatidas à época);
Pró-Pecuária (estudos sobre a lei do reajustamento pecuário);
As Caixas Econômicas Sob o Impacto da Legislação Fragmentária (1956, propedêutica e diagnose, segundo Carlos José de Assis Ribeiro, da conjuntura econômico-financeira das Caixas Econômicas);
Estrutura e Conjuntura das Caixas Econômicas Federais (propugnando pela necessidade de “uniformização e padronização das normas legais, regimentais e regulamentares pertinentes às vinte e duas autarquias orientadas e fiscalizadas pelo Conselho Superior" e "propondo critérios, métodos e sistemas para o planejamento administrativo, técnico e econômico-financeiro das operações passivas e ativas", além de sugerir "novos tipos de operações [....] apresentando uma análise sobre o custo do dinheiro" e defendendo as peculiaridades da administração do pessoal das Caixas, conforme síntese dessa obra apresentada, por ocasião de seu falecimento, pelo citado diretor da Caixa, CJ. de Assis Ribeiro, transcrita na História da Medicina em Uberaba, vol. III, p. 1.222 a 1.225);
Poupança Para Valorização do Cruzeiro (sobre o movimento que empreendeu nesse sentido quando presidente do Conselho Superior das Caixa Econômicas Federais); Novos Rumos Para a Diplomacia Brasileira (2ª ed., 1972), no qual se incluíram, além de outros ensaios pertinentes ao tema, "Miranda, Sua Vida e Seu Pensamento Político", "Areias Monazitas" e "A Internacionalização de Jerusalém".
No primeiro deles, abordou aspectos da vida do militar venezuelano Francisco de Miranda, um "dos precursores da independência dos países ibero-americanos" (p. 92) e cujo bicentenário de nascimento comemorou-se em anos da década de 1940. Principalmente, focalizou sua árdua luta em prol de seu ideal libertário, ora procurando apoio na Grã-Bretanha de Pitt, ora aliando-se e participando da Revolução Francesa sob a condição de apoio a seu projeto ("é o herói da batalha de Valmy, onde vence os prussianos", p. 98), e no decorrer da qual oscilou entre a glória e a prisão sob os humores dos jacobinos. Dele, Napoleão afirmou: "este homem leva em sua alma o fogo sagrado " (p. 100). Por fim, dissertou, com brilhantismo, a respeito do pensamento político de Miranda e sobre seus projetos independentistas.
No ensaio sobre as areias monazitas, apresentado em discurso na Câmara, expôs com clarividência o ponto de vista de que "torna-se necessário impedir o seu escoamento para o estrangeiro, como temos feito, malbaratando-a [....] Cumpre-nos resguardar o futuro industrial da Nação, no limiar da era atômica", para concluir que "o Brasil deve ser solidário com a grande nação ianque [...] Mas entre pensar desta maneira e caminhar no despenhadeiro de, em nome de uma amizade, entregar a um povo irmão uma riqueza que existe parcamente no mundo [...] é, por certo, uma tese que não encontrará um só brasileiro que a espose" (p. 110, 111 e 113). Infelizmente, enganou-se, porque muitos aqui nasci dos, antes, durante e depois dele, forcejaram e forcejam, em troca de trinta dinheiros, por entregar às transnacionais as riquezas do país.
Em "A Internacionalização de Jerusalém" advogou, em consonância com as aspirações católicas, a aplicação da resolução de 1947 da ONU que estabeleceu regime especial para a cidade, a ser mantida como corpus separatum administrado pela ONU.

BILHARINHO, Guido. Personalidades Uberabenses. 1.ed. Uberaba: CNEC Edigraf, 2014

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